Crítica Editora Zahar

Persuasão, de Jane Austen

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Um dos meus livros favoritos é Orgulho e Preconceito, de Jane Austen. A obra prima da escritora narra o intenso romance entre Darcy e Elizabeth Bennet trazendo como pano de fundo críticas sutis à sociedade inglesa e hoje é um dos livros mais vendidos em todo mundo. Agora chegou a vez de Persuasão ocupar um lugar bem especial na minha estante. 

O último livro de Jane Austen foi publicado postumamente por seu irmão e apesar de preservar a estética e o estilo da escritora possui características próprias que o distinguem de seu livro mais famoso.  

Persuasão traz a história de Anne Elliot, filha do meio de Walter Elliot - um viúvo aristocrata inglês escravo da sua própria vaidade e de seu ego. Anne tem duas irmãs: Elizabeth, a primogênita que se assemelha ao pai tanto fisicamente, quanto em temperamento, e Mary - cuja personalidade não sugere nenhuma simpatia. A caçula dos Elliot é frívola, invejosa e extremamente negativa.

Anne, por sua vez é doce, gentil e sensata. É bonita, mas não o suficiente aos olhos do pai que faz análises cruéis  em relação à sua beleza e ao seu temperamento, ainda que ela seja a mais íntegra e amorosa de suas três filhas. O patriarca da família Elliot a ignora na maior parte do tempo e só lhe dá o mínimo de atenção quando lhe convém. 

"Anne, cujo caráter elegante e trato gentil teriam lhe garantido um lugar de destaque em qualquer grupo dotado de real discernimento, não era ninguém nem aos olhos do pai, nem aos da irmã; sua palavra nada valia, seu papel era de ceder sempre - ela era apenas Anne."

A forma fria com que o pai a trata e a falta de afeto de sua família acabam aproximando-a de Lady Russel, uma amiga de sua falecida mãe que se torna quase uma "mentora" de Anne. Mesmo não aparecendo em muitas cenas do livro, Lady Russel tem um papel fundamental ao persuadir Anne a recusar a corte de um pretendente, o jovem Wentworth.

A condição financeira de Wentworth e principalmente a falta de um título significativo de nobreza fazem com que a amiga e a família influenciem Anne a se afastar de Wentworth, de quem Anne gostava muito mais do que imaginava. O preço que Anne paga ao se deixar persuadir por Lady Russel e sua família é caro: o capitão se afasta da jovem Eliott e durante 8 anos ela se fecha, culpando-se por sua escolha. A solidão e a melancolia tomam contam da história e do livro. que segue um rimo bastante linear. 

Durante este tempo, o estilo de vida desregrado e a falta de planejamento familiar acaba prejudicando as finanças do sr. Eliott, que se vê obrigado a mudar de cidade para alugar sua casa e manter seu status social a um custo de vida mais baixo. A cidade escolhida é Bath, e quem aluga a casa do sr. Eliott coincidentemente é o irmão do Capitão Wentwoth. Não demora muito para que o ex pretendente de Anne retorne à cidade, desta vez rico e muito respeitado socialmente. Este retorno reascende a paixão que Anne sentia pelo capitão. 

"Ela o havia maltratado, abandonado e decepcionado. Pior ainda: ao fazê-lo, havia demonstrado uma fraqueza de caráter que o temperamento decidido e confiante dele não podia suportar. Havia desistido dele para agradar aos outros. Havia cedido aos efeitos de uma persuasão excessiva. Havia sido fraca e acanhada."

As primeiras impressões de Anne não são boas. Mesmo tratando-a com civilidade e educação o capitão não se aproxima de Anne, o que a confunde em relação aos verdadeiros sentimentos. O ritmo é bastante cadenciado e a história tem longas cenas descritivas, o que desperta uma certa tensão e provoca expectativas, especialmente depois que o capitão se aproxima das irmãs Musgrove, irmãs de Charles Musgrove (marido de Mary, irmã de Anne). 

"O meu conceito de boa companhia sr. Elliot, é estar acompanhada por pessoas inteligentes e bem informadas, que saibam conversar; é isso que chamo de boa companhia."




"Sentia poder confiar muito mais na sinceridade daqueles que às vezes exibiam alguma expressão ou diziam alguma palavra descuidada ou apressada do que na daqueles cuja presença de espírito jamais variava ou cuja língua nunca escorregava."

Apesar do estilo característico de Jane Austen, Persuasão apresenta elementos bem distintos de Orgulho e Preconceito e outras obras, a começar pela protagonista. Confesso que não me encantei ou me apeguei tanto à personagem de Anne como aconteceu com Elizabeth por exemplo, mas ainda assim não deixei de torcer para que ela tivesse um desfecho merecidamente feliz na história. Mesmo sendo gentil e ponderada, seu comportamento quase subserviente algumas vezes me incomodou, embora suas motivações sejam exclusivamente altruístas e não por se inferiorizar. Creio que a solidão e o término de sua relação com o capitão tornaram-na tão melancólica e solitária, e de certa forma ela se culpava por ter se deixado persuadir no passado.

O capitão Wentworth, por sua vez, guarda um certo mistério já que não sabemos ao certo quais são seus verdadeiros sentimentos por Anne. A narração em terceira pessoa contribui para esta melancolia característica da história, já que os personagens não se abrem nos poucos diálogos ao longo do livro. 

O ritmo cadenciado e melancólico fazem de Persuasão uma obra única, especialmente por apresentar uma heroína diferente: apesar de sua bondade e discrição, Anne não é tímida e parece sempre conformada com seu destino. Ela se destaca em meio à sua família interesseira, manipuladora e fútil, adora ler e é uma mulher sensível e inteligente. 

As críticas sociais e o contexto da sociedade inglesa regencial são bastante discretas, mas estão presentes no livro seguindo a melancolia e a sutileza característica da história. Persuasão deixa o senso de humor característico de Austen de lado e dá o tom exato da solidão vivenciada pela protagonista.

"O único privilégio que reivindico para o meu sexo (que não é dos mais invejáveis, não há porque cobiçá-lo) é o de amar por mais tempo quando o objeto ou a esperança já se foram." 






A Edição da Editora Zahar traz ainda um resumo biográfico que enriquece a leitura e diz muito sobre os livros de Jane Austen, revelando características comuns aos seus textos e traçando o estilo que a consagrou como uma das maiores escritoras de todos os tempos.

Um ponto positivo são as notas de rodapé, que acrescentam informações interessantes à leitura. Além disto a edição traz duas novelas inéditas da escritora.

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