A situação humana Aldous Huxley

A situação humana, de Aldous Huxley

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Por trás de uma obra da envergadura de Admirável Mundo Novo (1932) existe uma quantidade imensa de opiniões e ideias acerca do homem e do mundo. Aldous Huxley, autor do clássico da distopia literária, revela em A Situação Humana um pouco mais acerca da sua visão de mundo.

Trata-se da compilação de uma série de palestras conferidas no ano de 1959, na Universidade de Santa Barbara, nos Estados Unidos. O linguajar é acessível, dispensado um grande conhecimento teórico para acompanhar a argumentação apresentada, mesmo quando o autor fala sobre filosofia ou ciência. 

Uma rápida olhada no sumário permite perceber que os temas abordados são os mais variados, desde arte e religião, incluindo considerações sobre guerras e a natureza humana. A obra não requer leitura sequencial, podendo o leitor ler cada capítulo mesmo sem seguir a ordem apresentada, o que não influenciará na compreensão. Por ser compilação de palestras, os textos possuem tom de ensaio e expressam a opinião pessoal do autor. 

"Depende de nós decidir se essas conquistas da natureza e do conhecimento devem ser usadas para fins terríveis e desumanos ou se devem ser empregados para criar o tipo de progresso que sonhamos – e, na verdade, um tipo de progresso com que ninguém jamais sonhou, porque as potencialidades que agora se divisam jamais estiveram presentes antes na história do mundo."


O primeiro texto é uma crítica à segmentação do ensino em disciplinas separadas, sem que exista transversalidade. Segundo o autor, o aprendizado altamente especializado pode conduzir à perda de uma visão panorâmica dos problemas, dificultando encontrar soluções para as questões dos homens em geral. 



Logo em seguida, Huxley faz um alerta acerca a devastação que o homem promove no planeta e destaca a criação de regiões desérticas causadas pela pecuária extensiva.

No decorrer do livro fica claro, também, o posicionamento filosófico de Aldous Huxley. Ele tece, por exemplo, críticas à Platão por ter produzido uma obra demasiada metafísica e pouco prática, ao mesmo tempo em que exalta o realismo de Francis Bacon. Embora eu não compartilhe da mesma visão filosófica com o autor, fica claro que ele pretende se debruçar sobre problemas da vida real dos homens, tratando-os de maneira prática e direta.
"Podemos praticar misticismo em termos inteiramente psicológicos, e com base num completo agnosticismo no que diz respeito às ideias conceituais da religião ortodoxa, e ainda assim obter o conhecimento – gnose –, e os frutos do conhecimento serão os frutos do espírito: amor, alegria, paz e a capacidade de ajudar outras pessoas."



Um dos capítulos que mais me chamaram a atenção foi o sobre Guerra e Nacionalismo. Ele inicia tratando sobre guerra conflito, explicitando que a guerra seria uma resposta contrária ao que naturalmente temos em um conflito dentro da mesma espécie, uma vez que o fim da guerra é a destruição, enquanto o conflito, na maioria das vezes, não possui um fim derradeiro.



Na sequência, o autor analisa as origens do nacionalismo como sendo de caráter ideológico, pontuando que não existe propriamente diferenças de raça ou religião no surgimento de uma nação, mas predominantemente diferenças de correntes de pensamento. O nacionalismo parece, segundo o autor, ser o grande motor de guerras, havendo uma confluência econômica para a manutenção dos conflitos bélicos. Uma solução, segundo Huxley, estaria em diferentes direções: na política, na moral, na persuasão e na tecnologia. 



O livro é um mergulho no pensamento de Huxley, ficando clara a retomada de vários temas tratados em seus romances. Embora sirva de alerta para os perigos da humanidade, os temas abordados não trazem uma visão otimista, ms sim realista sobre o futuro do mundo.
A leitura aborda uma série de possibilidades, desde as mais catastróficas até as mais otimistas, revelando a possibilidade de se criar um mundo melhor se os problemas do momento forem levados a sério e resolvidos de maneira racional. Pelo menos o grande medo que permeava a época em que as palestras foram conferidas, a da destruição por bombas durante a guerra fria, não se realizou, e podemos dizer que em vários aspectos o mundo hoje superou uma série de problemas, embora outros tantos continuem a assombrar a humanidade.

"Podemos formar uma hipótese e estar perfeitamente preparados para alterá-la quando aparecerem fatos novos; não precisamos nos prender a ela a qualquer preço, e martirizar outras pessoas por causa dela."
Seja para fãs, seja para interessados na visão singular de mundo de Aldous Huxley, A situação humana se revela uma leitura fluída e gostosa. Vale a pena conferir estes e outros temas comentados pelo autor mesmo que, como eu, o leitor se posicione criticamente às opiniões defendidas.

Fernando Ruiz Rosario. Piracicabano, graduado em Filosofia pela UFSCar e mestrando na mesma área na UFMG. Gasta seu tempo livre com fotos, livros, séries, filmes, viagens e longas discussões.






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